Making a Toolbox” é um álbum conceptual do compositor e guitarrista madeirense, Bruno Ponte. O álbum inclui sete faixas originais, nas quais o artista procurou integrar elementos da cultura musical tradicional da Madeira no seu estilo composicional, com o intuito de criar uma linguagem individual e explorar novas direções musicais.

Benji’s Toolbox é um projeto que une influências diversas, desde a música tradicional madeirense ao jazz, blues e metal. A narrativa gira em torno do personagem fictício Benjamin, cuja vida é retratada em ambientes e emoções sonoras. O projeto surgiu do desejo do compositor em criar uma plataforma musical sem barreiras estilísticas, onde pudesse experimentar diferentes formas de expressão. O resultado é uma “caixa de ferramentas criativa”, onde diferentes estilos se combinam para construir a jornada de Benjamin.

#1 Benjamin

Comecei esta música com a ideia de criar um “drop” lento com a formação deste projeto. Tentei perceber como, e fui desencantar alguma coisa a quem o faz bem que é a meu ver, a malta do metal. Acabei por ficar com a “In Your Words” dos Lamb of God na cabeça. Em termos de bateria era algo que podia funcionar no entanto, quanto à componente melódica, encontro sempre alguma dificuldade em como trazer algo do mundo lírico, para o mundo instrumentístico, ou seja, melodias (ou conteúdo que leva a música em frente) que soem de facto melhor nos instrumentos do que na voz com letra (neste contexto estou a ausentar a voz da minha formação do lado lírico).

Para essa questão a resposta até foi rápida. A “The Human Journey in Search of Meaning” do João Barradas sempre me ficou na cabeça. Aquela interação entre o groove a 2/4 e as melodias com contratempos a fusas do soli final que é, no caso dele, o auge da música, funcionaria perfeitamente.

Para a divisão dos 3 instrumentos melódicos (guitarra, sax tenor e voz) tentei mudar um bocadinho a norma e pus a guitarra no registo mais grave e o tenor no registo médio. Isto causaria um espectro de frequências geral de grupo muito médio-grave, mas estava optimista que com um bocadinho de tratamento no som da guitarra, poderia encontrar um mundo onde nenhum instrumento se abafa.

Depois de criar conteúdo suficiente, a música ganha uma “personalidade” e condiciona o caminho. A melodia tercinada foi o mais natural para arrefecer do momento “pesado” anterior. Na altura, como ainda não sabia o que se seguiria, queria manter o foco na primeira parte, porém, tive de desenvolver bastante este novo momento até deixar-se acabar, pois nenhuma das minhas tentativas de forçar uma transição resultou. Visto que o conteúdo propulsionador em ambas as partes é do mesmo gênero, melódico com um ênfase rítmico muito identitário, ambas as partes não são compatíveis. Com isto quero simplesmente dizer que não podia introduzir fusas na parte tercinada ne vice-versa.

Quando encontrei um fim para esta parte, o caminho do ambiente anterior abriu-se novamente, mas desta vez, visto que já não era conteúdo introdutório, poderia ganhar ainda mais força. Desenvolvi esta nova parte que culminou num solo de guitarra que voltava perfeitamente para a parte inicial.

Agora com uma visão mais concreta da música total posso assumir uma postura de arranjador. O crescendo de piano no início, a junção à guitarra da voz (parte calma) e do sax (retorno das fusas) nas várias partes, solos, desenvolvimento das várias melodias para 3 vozes, são só algumas das várias decisões que pude tomar posteriormente.

#2 A Tin Can's Pulse

Eu tinha feito o loop inicial numa aula de composição como demonstração de algo do qual não me recordo, o qual ficou gravado no meu RC-3. A segunda parte com a melodia principal saiu-me com alguma facilidade. Por alguma razão, achei por bem fazer este exercício composicional de tentar ligar estas duas partes. Depois de algumas tentativas, acabei melodia principal, dividi-a em duas vozes com algum jogo rítmico, fiz o separador entre solos como alusão a loop inicial e fiz o clichê de acabar a música com solo de bateria.

#3 Sampi

Tenho um fraquinho por músicas deste gênero, com este feel. Queria fazer algo parecido à Scoville, à Headrocker do Gilad Hekselman, ou à September e October do Seasons do Ben Wendel. Foi composta ao instrumento e saiu-me com alguma facilidade. Houveram algumas lutas para torná-la em algo interessante, como por exemplo, as respostas da guitarra ao Sax para desenjoar um bocado, alguns dos kicks foram ajustados para dar, ou continuidade, ou finalidade à música, entre outras pequenas coisas. No fim de tudo estar feito percebi que era a progressão do Sweet Home Alabama.

#4 Boss Battle

Esta tem mais algum tempo, veio de uma versão desta banda ainda muito precoce. Lembro-me que a minha ideia era tomar sempre decisões contrárias à minha zona de conforto, dentro de uma base a 4/4 no baixo. Agora com mais alguma experiência neste tipo de ambiente, pude fazer algumas atualizações para o álbum. Dei-lhe um B, simplifiquei a harmonia e mudei o fim.

#5 Y a Luz

Em tudo o que faço da minha autoria quero manter esta prática de fazer pelo menos uma canção. É uma ciência própria, com especificidades muito peculiares. Tento não pensar muito no conteúdo principal da melodia. Tem de ser forte, singular com poucas notas, repetível e, para mim, ter um quê de clichê, ou ser meloso o suficiente para colar. Na versão anterior do projeto tinha também feito, juntamente com o Tom Maciel, uma balada a 3 (chama-se This Year’s Summer Got Lost, é tocada ao vivo). Esta é a minha segunda tentativa a algo do mesmo estilo. Compus com a ajuda do Braguinha, um instrumento tradicional Madeirense, pai do ukelele e o meu primeiro instrumento, por ser um meio que traz certos traços interpretativos que queria que caracterizassem o tema. Fi-lo, mostrei à minha mãe, gostou, dei o nome dela à música com um twist.

#6 Make-Believe, Turn Real

O Taylor Eigsti, o Tigran Hamasyan e inúmeras bandas que adoro de Rock e Metal progressivo fazem músicas à volta de ostinatos incrivelmente bem. Tentei várias opções e muitas ficaram pelo caminho, pela dificuldade que eram por acabar. Peguei então numa ideia qualquer que já tinha feito e desenvolvi-a até ter um conjunto de voicings em ostinato que gostava. Pôs-se novamente em cima da mesa a questão do conteúdo melódico e desta vez embirrei que queria fazer algo entre o baixo e a voz, os mais distantes da formação. Demorei a encontrar algo que funcionasse e a perceber como ambos os instrumentos poderiam interagir. Acho que desta vez vou saltar a longa explicação das constatações que fiz durante este processo, mas posso dizer que tenho a sorte de ter pessoas a meu lado com um virtuosismo tal, que fazem “o tocar” este material parecer fácil.

Peguei na ideia mais catchy da intro e transformei-a em melodia principal desenvolvendo-a pela harmonia. O resto foram questões estruturais: solo de voz sem bateria, solo de guitarra e um fim decidido na montagem do tema com o grupo.

#7 Wooden Strings

Este tema é o mais antigo deste grupo e não foi ajustado para o álbum. Compus quase tudo no braguinha e a ideia era ser o mais fiel possível ao que eu conhecia do repertório da música tradicional madeirense com alguns dos meus inputs. Foi a primeira vez que estava a tentar criar algo que passasse por vários momentos de forma natural e de esmiuçar o material temático para obter vários momentos na mesma formação. Como exercício tentei forçar o meu estudo de Lennie Tristano no soli: um vocabulário mais linear, pequenos motivos rítmicos dentro das frases e idiomatismos. O processo de composição desta música é provavelmente o que tenho menos presente, mas posso dizer que de todas é a que me dá mais gozo de solar.


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