Reportagem


Kelela

Amor em tempos de chuva

NOS Primavera Sound

09/06/2018


Surgiu em palco de branco da cabeça aos pés com uma audácia felina sedutora. Num dia em que a chuva não concedeu santuário, Kelela parecia-nos uma figura profética capaz de realizar um milagre. Não, não parou de chover, mas quase nos esquecíamos dela.

Detentora de uma voz de diva de RnB, a artista norte-americana levou-nos numa viagem de vulnerabilidade por todos os recantos de “Take Me Apart.” A eletrónica que cultiva transforma-a numa artista transversal à pop. Se hoje está no palco Superbock do NOS Primavera Sound, não nos admiraríamos de a ver daqui as uns anos a pisar uma variedade mais “mainstream” de espaços.

Ao fim da primeira canção, “LMK;”  dirige-se ao público portuense com carinho inesperado. “It means so much to me that you’re standing in the rain.” Meu dito, meu feito. Nem dois minutos depois enxagua os olhos em lágrimas. “I’m not good at singing and crying,” admitia em emocionado mea culpa.

A artista recompor-se-ia sem esforço. A voz recuperava o seu veludo e amiúde arriscava-se em agudos que traziam uma jovem Mariah Carey à memória. (Os IDLES teriam gostado).

Movimentos esguios não faltaram para nos hipnotizar e, não querendo entrar por campos que suscitariam toda uma dissertação sobre o “male gaze”, confessamos que teremos que passar as próximas semanas a explicar ao nosso coração que não está apaixonado.

“I have never been here before so I have no idea who knows and who is connecting with my music,” explicava por entre elogios ao Porto e aos festivaleiros antes de cortar fundo com a faixa homónima de “Take Me Apart.”

Mais tarde explicaria que havia escrito um tema sobre alguém “was being really mean to me, so I broke up with him,” e custa-nos a acreditar que há alguém assim de idiota. É uma honestidade frágil e autodeterminada que distingue Kelela num mundo saturado com divas soul.

“Obrigado a million times,” agradecia antes de terminar a setlist programada. Felizmente, neste dia cinzento houve um colorido de boas notícias. “I have never been told in my entire career , that at a festival, I have time.  I have an extra an extra song, is that okay with you guys?”

Sim.

“Sick.”

Ouviu-se “Rewind” nos últimos momentos do concerto. Aplaudida e cantada pelos festivaleiros que se concentraram no palco Superbock, a canção pontuou uma performance que, segundo a artista, a levaria a corar “if I weren’t brown.”

Galeria


(Fotos por Hugo Rodrigues)

sobre o autor

Jorge De Almeida

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