Três anos depois de The Hurt Locker (Estado de Guerra), o surpreendente grande vencedor dos Óscares de 2010, Kathryn Bigelow regressa com uma arriscadíssima obra sobre o processo de captura a Bin Laden no pós-11 de Setembro. Nesse filme, Bigelow mostrava ser alguém que faz um cinema muito metódico e atento aos detalhes, mas que, com algum exagero, pode pecar por uma certa falta de alma. Curiosamente, pode ser esse traço que faz Zero Dark Thirty escapar de um desastre anunciado.

A história assenta numa mulher que parte dos escritórios de Washington para as células clandestinas da CIA e que, de forma surpreendente e sem que inicialmente alguém lhe dê grande crédito, se torna a estratega e responsável directa pela morte de Bin Laden. Era fácil com um argumento destes pensar num filme sentimentalão, condescendentemente machista e/ou patrioteiro barato, mas Zero Dark Thirty mostra alguma ponderação e intensidade psicológica e evita entrar naquele banal filme de acção pró-americano. É certo que há alguns momentos mais discutíveis, mas as piadas óbvias são evitadas e a tortura não é escamoteada, sendo até, por vezes, apresentada com alguma ironia (veja-se o contraste entre os violentos interrogatórios e o discurso de Obama sobre a defesa americana dos direitos humanos).

Para sustentar alguns méritos do filme está, enquanto protagonista, uma das melhores actrizes da actualidade. Embora de forma mais contida do que nos notáveis Take Shelter ou Tree of Life (talvez lhe falte alguma liberdade para brilhar), Jessica Chastain encarna bem esta mulher profundamente inteligente, quase paranóica na busca de um objectivo e falsamente segura e fria. Por fim, é ela que dá consistência a um plano final cinematograficamente intenso, verdadeiro culminar de um epílogo apropriadamente sóbrio.

Enfim… Zero Dark Thirty não é particularmente entusiasmante, nem uma reflexão profunda sobre a essência e as razões que motivam o terrorismo anti-americano e a respectiva resposta. Tal como em Estado de Guerra, é sobre o momento e não se foca muito no que o antecede. Mas vê-se sem incómodo, sem que a suposta superioridade moral e a fantasia iluminista do God save America sejam excessivamente vincadas.