Swans: aos que não morrem mesmo quando se despedem

por José V. Raposo em 4 de Outubro, 2017

Swans: aos que não morrem mesmo quando se despedem
© Samantha Marble

Em 1997, a encarnação original dos Swans chegou ao fim, sem apelo nem agravo e de forma planeada. Não havia grandes novidades quanto ao futuro e o mundo ficou a aturar os The Verve e demais cambada – valeram-nos os Hanson, os Mogwai e o que restava do eurodance. Os mestres Gira, Jarboe e Westberg matavam o monstro sónico de muitas peles e garras que vinha devassando barreiras musicais e flagelando ouvidos por esse mundo fora desde 1982.

Em 2010, Gira diz-se não possuído pela loucura e avisa que a Fénix em forma de cisne está de volta. Expectativas a monte, crescimento, que nem cogumelos, de fãs de Swans desde pequeninos e a fúria de opinadores que, do alto do púlpito do escárnio dos pobres de espírito, publicariam o édito de que Swans sem Jarboe não durariam muito/prestariam para alguma coisa. Certo é que, ainda incrédulos, acorreram todos aos vídeos dos primeiros concertos do regresso – será que se trata de mais uma reunião da treta, sem chama, sem potência, desfasada no tempo, como a dos Pixies? Ou seria um regresso em grande, numa verdadeira nova era de uma banda mítica e influente, como a de uns Mission of Burma? Os últimos sete anos mostraram que a segunda hipótese foi a vencedora.

A passagem da banda por uma Aula Magna que não encheu em 2011 (fixe, fixe, era a banhada indie du jour, não era?) foi um tufão de imprevisibilidade: entradas e saídas de palco e um Gira na sua mais recente encarnação: de maestro do caos, gesticulando qual manobrador de ruído e música de anjos caídos em desgraça ou de diabos demasiado criativos.

Desde então, passagens por Portugal mais ou menos constantes (abençoado seja este País), incluindo um magnífico concerto no Amplifest, em 2014 – o nosso concerto campeão desse ano. Certos adjectivos são uma piroseira e um lugar-comum, mas “transcendente” aplica-se na perfeição ao que ali se passou: proximidade com o público naquela sala 1, em assalto sonoro e suadouro exaltados, com a passagem em revista da obra mais recente da banda (por essa altura, The Seer To Be Kind), num total de duas horas de elevação espiritual e artística espartana e bela à sua maneira.

Com mais ou menos arranjos e mudanças na formação (saudades Thor Harris), os anos desta encarnação dos Swans foram passando – o financiamento colaborativo de álbuns na Young God deu melhor uso ao nosso dinheiro do que a banca ou o Estado. Visita-nos esta formação uma última vez, em salas que tiveram outros usos, em zonas outrora decadentes: o Hard Club e o Lisboa ao Vivo. Duas certezas para os próximos concertos: ficarão para a História e, como diria T.S. Eliot em Wasteland, os rios Tejo e Douro suarão óleo e alcatrão numa gigantesca onda. Com ou sem alucinações com a Lady Gaga. Pela última vez com estes titulares, quem vos dera estar no Hard Club ou no Lisboa ao Vivo a ouvir Swans.

Bem-aventurado sejas, Michael Gira. Ontem, hoje e sabe-se lá mais quando. Mas só o Filth continua a interessar, contudo.

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