Paul Newman: Um Deus entre Estrelas

por Natália Costa em 23 Janeiro, 2017

Paul Newman é indubitavelmente um dos melhores actores de sempre e é o the one dos meus all time favourites. Os seus magnéticos olhos azuis apaixonaram audiências e o seu trabalho filantrópico comoveu diversas gerações. A 26 de Janeiro, Newman completaria 92 anos.

Newman nasceu em Cleveland, Ohio a 26 de Janeiro de 1925 como Paul Leonard Newman. Filho de pai Judeu e de mãe Cristã, Newman cresceu em Shaker Heights, na companhia dos pais e do irmão mais velho. O pai tinha uma loja de desporto e Newman trabalhava lá depois da escola. A mãe adorava Teatro e sempre encorajou Newman a participar nos eventos artísticos da escola. Newman participou nalgumas peças, mas o que o apaixonava mesmo era o desporto e esperava vir a tornar-se um jogador de futebol profissional. Newman serviu na Marinha, no Pacífico, durante a Segunda Guerra Mundial. Queria ser piloto, mas devido ao daltonismo acabou por ter de servir como operador de rádio. Ao regressar inscreveu-se na Faculdade de Kenyon em Ohio em 1946 com uma Bolsa de Desporto para a equipa de futebol. Uma noite, depois dum treino, os espíritos elevaram-se e Paul, mais uns colegas, foram presos. Anos mais tarde Newman viria a dizer a propósito dessa experiência: “I got thrown in jail and kicked off the football team. Since I was determined not to study very much, I majored in theater the last two years”. Em 1949 Newman passou um Verão a fazer teatro em Wisconsin onde conheceu a sua primeira esposa Jacqueline Witte. Casaram-se e continuaram nesse estado até à morte do pai de Newman em 1950 quando se mudaram para o Ohio. E nasceu o primeiro filho do casal, um menino de nome Scott. Newman concordou que o seu irmão tomaria conta do negócio do pai e mudou-se com a mulher e o filho para Connecticut para estudar na Escola de Drama de Yale. Com necessidade de recursos financeiros, Newman abandonou a escolha ao fim de um ano e mudaram-se para Nova Iorque. Passou algum tempo a estudar o famoso Método do Actor’s Studio e começou a aparecer nalgumas peças da Broadway. A primeira peça em que participaria seria Picnic em 1953 onde conheceria Joanne Woodward. A amizade (that’ what they call it) entre ambos seria imediata e anos mais tarde Newman acabaria por se divorciar para casar com Joanne.

Após alguns papéis secundários no cinema – nomeadamente The Silver Chalice, do qual o actor viria a dizer “the worst motion picture produced during the 1950s” e pelo qual publicaria em 1963 nos jornais locais “Paul Newman apologizes every night this week – channel 9”, numa semana em que o filme seria exibido na televisão – Newman conseguiu o papel de Rocky Graziano em Somebody Up There Likes Me, um filme baseado na história verídica do pugilista e que termina com uma cena que eu adoro: “Somebody up there likes me.” Resposta: “Somebody down here too!. Esse é o grande break through de Newman.

Paul Newman e Joanne Woodward

Seria durante a rodagem de The Long Hot Summer, onde contracenava com Woodward, que Newman deixaria a primeira mulher, com quem tivera um menino e duas meninas. O casamento com Woodward tem lugar em Las Vegas a 29 de Janeiro de 1958, ainda antes do filme ser lançado nas salas de cinema. Como presente de casamento Newman deu a Woodward uma chávena de prata inscrita com: “So you wound up with Apollo/If he’s sometimes hard to swallow/Use this.” O sentido de humor de Newman era incontestável e anos mais tarde Joanne viria a dizer, a propósito do matrimónio: “Sexiness wears thin after a while and beauty fades, but to be married to a man who makes you laugh every day, ah, now that’s a real treat.” Em Março desse mesmo ano, Woodward recebe o Óscar de Melhor Actriz pela sua performance em The Three Faces of Eve.

Em Setembro ainda desse ano (ano em grande para Newman) é lançado Cat on Hot Tin Roof onde contracena com Elizabeth Taylor e pelo qual receberia a sua primeira Nomeação para o Óscar de Melhor Actor e que é, na minha opinião, um dos melhores filmes do cinema. São raros os filmes actuais que conseguem ter um argumento tão envolvente como este. Em 1959 Newman regressa à Broadway para fazer parte da produção original de Sweet Bird of Youth the Tennesse Williams, que é adaptado para cinema três anos depois e que é outro dos meus títulos preferidos. No filme, Newman contracena com Geraldine Page e é dirigido por Elia Kazan.

Seguiriam-se inúmeros êxitos como: Exodus, The Hustler (mais uma nomeação para o Óscar de Melhor Actor), Hud (nomeação também para o Óscar de Melhor Actor) e, outro dos melhores de sempre, Cool Hand Luke (e mais uma vez nomeação para o Óscar de Melhor Actor). Neste, Newman interpreta um presidiário de nome Luke cujas as peripécias e rebeldia viriam a marcar uma geração. Cool Hand Luke tem também um dos melhores posters do cinema, que foi escolhido para parte do cenário de 25th Hour de Spike Lee. Já para não dizer que os ovos cozidos nunca mais foram a mesma coisa! Ainda nesta década, Newman faz um filme que eu adoro de nome The Prize, um policial que tem um dos melhores argumentos da história do cinema e que é palco de cenas absolutamente hilariantes, protagonizadas por Newman, claro! Entretanto, Newman estreia-se na realização com um filme onde dirige Woodward de nome Rachel, Rachel. O filme recebeu quatro nomeações para os Óscares da Academia, entre as quais Melhor Filme e Melhor Actriz.

Em 1968 Newman fez parte dum filme mediano chamado Winning, mas que o iria despertar para uma paixão que se iria manter pelo resto da vida: corridas de carros. Em 1976 Newman viria a ganhar o seu primeiro prémio, em 1977 terminaria em quinto em Daytona e em 1979 seria o segundo em Le Mans, já com 55 anos. Em 1983 fundaria a equipa Newman-Haas e continuaria a correr nos anos 80 e 90 acabando por ganhar as 24h de Daytona com 66 anos. Os anos 70 foram uma época especial na era dos carros, em que estes ainda tinham um estatuto especial e lendas como James Hunt e Nikki Lauda (brilhantemente retratados em Rush) faziam do circuito automobilístico um desporto de elite.

Voltando a Newman e ao cinema, nessa mesma década (anos 70) seguem-se dois filmes lendários, ambos em que contracena com Robert Redford. Butch Cassidy and the Sundance Kid, que tem a famosa cena musical Raindrops Keep Fallin’ On My Head, uma das mais divertidas do cinema e testemunho da capacidade humorística de Newman. É um daqueles filmes míticos em que os heróis estão do lado contrário da lei e que tem uma sequência final memorável com toques de eternidade pelo certeiro freeze da câmara no momento final. Anos mais tarde, Ridley Scott repetiria o impacto do câmara freeze noutro dos meus preferidos: Thelma & Louise. The Sting, mais um dos meus all time favourites (é impossível não gostar deste filme), é também sobre dois bandidos, mas com muito estilo a lembrar filmes como Thomas Crown Affair, The Italian Job, Entrapment ou a saga Ocean’s. Quer The Sting, quer Butch Cassidy & the Sundance Kid são trabalhos intemporais que podem ser apreciados por qualquer geração.

Até aos anos 80, e apesar duma longa e talentosa carreira, Newman ainda não havia ganho nenhum Óscar. Em 1983 é nomeado para Óscar de Melhor Actor com The Verdict. Em 1985 recebe o um Óscar Honorário o no discurso de agradecimento diz: “I am especially grateful that this did not come wrapped in a gift certificate to Forest Lawn”. Forest Lawn é um cemitério famoso: Newman demonstra mais uma vez o seu sentido de humor acutilante. Em 1986 Newman volta ao seu antigo papel de Fast Eddie Felson desta vez contracenando com um jovem Tom Cruise em The Color Of Money e é-lhe (finalmente) atribuído o Óscar de melhor actor, mais a premiar a carreira do que propriamente o papel. Quero também mencionar um filme que adoro de nome Fort Apache: Bronxlançado em 1981, onde o actor interpreta um polícia e, apesar do filme ser um drama, mais uma vez tem uma sequência hilariante de que Newman é protagonista.

É também nesta década que Newman inicia uma cadeia de molhos para saladas com A.E. Hotchner, que entretanto se estende para pizzas, limonadas, molhos para cozinhar, bolachas e pipocas (era fã incondicional de pipocas e era habitual fazê-las de manhã, segundo Woodward, e também requisitá-las nos sets de filmagens). Estes produtos já fizeram mais de $300 milhões de dólares desde 1982. E a melhor parte é que todo o dinheiro conseguido reverte para um fundo destinado a crianças doentes. A empresa premeia também um indivíduo que tenha activamente lutado para o direito à Liberdade de Expressão. E é isto que torna Newman um ser humano admirável e uma estrela fora do firmamento. Quero salientar que Newman foi um dos poucos que explorou explicitamente a sua imagem com o propósito de gerar lucros totalmente direccionados para caridade. Newman fundou também o Scott Newman Center em 1978, após a morte de Scott (o único rapaz de entre os filhos de Newman) numa accidental overdose de álcool e medicamentos. Esse centro pretende travar o abuso de drogas através de programas educacionais. Newman também estabeleceu o Hole in the Wall Gang Camp (nome inspirado no gang de Butch Cassidy and the Sundance Kid) para dar a crianças com doenças terminais umas férias memoráveis. Em 1988 o primeiro campo foi aberto em Ashford no Connecticut. E existem oito campos entre E.U.A., Irlanda, Reino Unido e França. A sua dedicação à filantropia valer-lhe-ia o Prémio Humanitário Jean Hersholt em 1994.

Ao aproximar-se dos seus 70 anos, Newman continuou a deliciar as audiências em papéis como Nobody’s Fool (mais uma nomeação para Melhor Actor) ou Road to Perdition (que lhe valeria a sua última nomeação para o Óscar, desta vez como Actor Secundário). Newman participaria também na série Empire Falls em 2005, onde voltaria a contracenar com a sua esposa Joanne Woodward e pela qual ganharia um Emmy.

Sendo carros uma paixão incontestável de Newman, acabou por emprestar a voz para Doc Hudson, um carro de corridas reformado, no filme de animação Cars em 2006. Também usou a sua voz para narrar The Price of Sugar, um documentário sobre o trabalho do Padre Chritopher Hartley e os seus esforços para ajudar os trabalhadores da cana de açúcar da República Dominicana. Newman participou também em Our Town, uma peça de teatro sob a supervisão de Kevin Spacey de onde se despediu dos palcos. Nesse ano, Newman anunciou que se retiraria do cinema: “I’m not able to work anymore as an actor at the level I would want to. You start to lose your memory, your confidence, your invention. So that’s pretty much a closed book for me.”

Rumores da doença de Newman começaram a surgir e com o habitual sentido de humor o comité de Newman informou que a lenda de cinema estava em tratamento para queda de cabelo e pé de atleta. A 26 de Setembro de 2006 Newman faleceu de cancro na sua casa em Westport, Connecticut. Mais do que uma estrela, Paul Newman era um ser humano notável que inspirava com o sentido de humor e a dedicação às suas paixões, fosse o cinema, os carros ou as causas humanitárias.

Nas suas próprias palavras:

“To enjoy the sensation of driving and racing, and to be able to see the effect of it in your mirrors, that extra 10 feet you built up coming out of a particular corner. You know, that’s the kick in the ass. That, my friend, is living.”

“You can’t be as old as I am without waking up with a surprised look on your face every morning: ‘Holy Christ, whaddya know – I’m still around!’ It’s absolutely amazing that I survived all the booze and smoking and the cars and the career.”

“I’d like to be remembered as a guy who tried — tried to be part of his times, tried to help people communicate with one another, tried to find some decency in his own life, tried to extend himself as a human being. Someone who isn’t complacent, who doesn’t cop out.”

“I’ve repeatedly said that for people as little in common as Joanne and myself, we have an uncommonly good marriage. We are actors, we make pictures — and that’s about all we have in common. Maybe that’s enough. Wives shouldn’t feel obligated to accompany their husbands to a ball game, husbands do look a bit silly attending morning coffee breaks with the neighbourhood wives when most men are out at work. Husbands and wives should have separate interests, cultivate different sets of friends — and not impose one upon the other.”

“Building weapons that we don’t need, don’t work, and aren’t necessary, and have no mission — that’s not bad politics, that’s robbery.”

“When I realized I was going to have to be a whore, to put my face on the label, I decided that the only way I could do it was to give away all the money we make. Over the years, that ethical stance has given us a 30 per cent boost. One in three customers buys my products because all the profits go to good causes and the rest buy the stuff because it is good.”

“I don’t think there’s anything exceptional or noble in being philanthropic. It’s the other attitude that confuses me.”

“The concept that a person who has a lot holds his hand out to someone who has less, or someone who isn’t hurting holds his hand out to someone who is, is simply a human trait that has nothing to do with celebrity. I am confounded at the stinginess of some institutions and some people. I’m bewildered by it. You can only put away so much stuff in your closet. In 1987, the average CEO against someone who was working in his factory was 70 times. It’s now 410 times.”

“I’m like a good cheese. I’m just getting mouldy enough to be interesting.”

“I started my career giving a clinic in bad acting in the film The Silver Chalice, and now I’m playing a crusty old man who’s an animated automobile. That’s a creative arc for you, isn’t it?”

“Men experience many passions in a lifetime. One passion drives away the one before it.”

O que os outros dizem sobre Paul Newman:

“There is a point where feelings go beyond words. I have lost a real friend. My life — and this country — is better for his being in it.” (Robert Redford)

“To say he was an extraordinary man would be an understatement. It seems to me to be one of the great 20th century lives: he was famously generous, with his extraordinary and unstinting work for his charities; he was a passionate advocate for the adrenaline and danger of his beloved racing cars; he was a shining example of how to use global fame for the greater good; and most of all he was one of the great movie actors of this or any other age. For me personally, working with him was the highlight of my professional life. He saw himself as a working actor, not a movie star, and insisted that everyone else did the same. There was no ego, no entourage, no hangers on. Only Paul, his script and his incredible spirit. One can say this about very few people, but he was a truly great man.” (Sam Mendes)

“He was one of the greatest screen actors of all time and a beautiful man. I think an era just ended.” (Daniel Craig)

“I knew him only a little; at work, on the race track and in his charity. In all cases the common feature was his easy smile, his unshakeable determination and his unaffected and sincere concern for others. He was one of nature’s gentlemen.” (Kenneth Brannagh)

“There is a moment in every film that he made where he looks and you understand you are in the presence of a guy who knows what he’s doing. He was driven by the tragedy of the death of his son to channel his grief into a charity project and using his name very skilfully. That was the way of getting through a terrible time. His other hobby was motor racing. The people he competed against and worked with on the circuit in America regarded him as a driver who could do a bit of acting rather than the other way round. “It was also I suspect his way of getting away from that Hollywood game he never played. He never partied, he never parleyed with the studio bosses. He was his own man and that came through significantly in his acting. He had no need to or saw the thought to explain what he did to anybody and that made him seem quite a boring fellow. In a sense he wasn’t a jocular, jolly man at all. But there is nothing wrong with that. That isn’t what he was put on Earth to do, he would say he was put on Earth to act. He was possibly the greatest of his time.” (Sir Michael Parkinson)

“Cinema wouldn’t have been the same if he hadn’t come along. Paul Newman will live on thanks to the quality of his films. It was a terrific body of work which continued right into the latter part of his life. Like many young people in the business today he was a very good looking and he became famous very quickly. But he knew from the very beginning he would have to prove himself as an actor, and prove himself he did. Paul never let any of the success go to his head and he was a very humble man who didn’t like a fuss.” (Kevin Spacey)

“Paul Newman was that rare creation – an actor and a gentleman. He was a superb humanitarian, beginning decades ago when it was not fashionable to care about underprivileged children and third world poverty. I will miss him very much.” (Joan Collins)

“He has a good character, and not many people do. I think he would rather not do anything wrong, whether on a moral or an artistic level. He is what you would call a man of conscience — not necessarily of judgment, but of conscience. I don’t know any actors like that.” (Gore Vidal)

“Paul likes to test himself. That’s what makes Paul run. He’s got a lot of courage, a highly underrated element in people’s lives these days.” (Joanne Woodward)

“He is the most private man I’ve ever known. He has a moat and a drawbridge which he lets down only occasionally.” (E. Hotcher)

“Sometimes God makes perfect people and Paul Newman was one of them.” (Sally Field)

 

 


sobre o autor

Natália Costa

"Sometimes nothing can be a real cool hand." (Ver mais artigos)

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