Esporádica que seja a presença discográfica do Padrinho do Gótico, em palco mantém-se tão regular quanto possa e ainda nos consegue surpreender quando pretende alargar um pouco o seu legado a solo. Talvez “Silver Shade” não estivesse no topo da lista de desejos da maioria, mas não dá para evitar o consolo ao ouvir Murphy a variar tanto entre estilos e a manter a marca inconfundível.
Que haja um legado mais impactante em quatro discos de Bauhaus na década de 80 do que em todo o seu corpo a solo. Que este “Silver Shade” acabe por ficar muito próximo do que já era “Lion,” o antecessor, mesmo que esse já conte mais do que uma década. Tudo isso é irrelevante porque já estamos envolvidos nestas canções. É o forte de Murphy, que ainda não perdeu aos 67 anos. Continua a ser um escritor de canções de invejar. Não sabemos se existirão aqui muitos clássicos para o futuro, mas é tudo do mais catchy, emocional e variado que podíamos esperar. Não soa a sobras do “Lion.” Nem a tentativas ocas de igualar o “Should the World Fail to Fall Apart” ou o “Love Hysteria,” muito menos alguma coisa de Bauhaus.
Há pós-punk, logo de início, há maiores submissões ao upbeat da new wave e do synthpop; há um lado sinistro que não deixa que isto em algum momento se afaste do gótico; há rock acessível e quase solarengo, há punk mais ruidoso – a forma como “Soothsayer” antecede a fase final, a mais emocional do disco, tem que ser de propósito; há passado e há presente. Há coisas para fãs de Killing Joke – Youth anda por aqui, na produção – há para fãs de Depeche Mode, de um industrial mais ameaçador dos Nine Inch Nails, – claro que Trent Reznor anda por aqui – para fãs de David Bowie no seu mais excêntrico, para novos “gógós” e para os saudosistas – Boy George anda por aqui. Muito do que está ai listado já é do influenciado por ele. Peter Murphy tem pedalada para os apanhar. E para fazer um disco como “Silver Shade,” que podia ser tão dispensável a esta altura, valer tanto só por si, como um conjunto de canções, uma compilação de êxitos que ainda não existiam. Mesmo que, para os palcos… A malta vá a querer o costume.