É normal que muito do peso nisto do doom, e dos seus subgéneros mais extremos, não esteja só na distorção e força dos riffs ou no tipo de vocalização por que optem. Muito está na carga emocional, na melancolia e até dá para separar quem é que só toca disto porque é giro e quem é que o sente mesmo, porque não dá para o fingir se essa parte não for mesmo genuína. Para o primeiro longa-duração dos nossos My Dementia, seria impossível fingir tal coisa e é mesmo dor que existe neste afinal profético “Premonição: Só Me Arrependo do que Não Vivi.

Afinal o disco veio a tornar-se póstumo, com a chocante partida do vocalista e guitarrista Miguel Carneiro, logo a seguir à conclusão do disco. Resiliência e vontade de agradecer e prestar homenagem levou a restante banda, especialmente o irmão Vasco, a andar para a frente e engrandecer o seu luto com o lançamento do disco que sela o legado de Miguel e documenta algo tão soturno e emocional. Que já o era. E passou a ser ainda mais. Uma camada extra sobre um disco já tão denso e que já tratava tão bem aquele que ainda será dos estilos de música mais melancólicos.

Recorre ao death doom de raíz, com alguma melodia sem cair na repetição de muitos actos mais recentes que apresentam mesmo uma marca de death doom melódico, – cuja colheita parece estar cada vez maior ultimamente e a trazer muito joio – mas que deixe pender para o gótico. Se lembrar algo nosso, pode ser algum riff que remonte aos Açores, aos A Dream of Poe. De resto, é uma escola Britânica de “My Dying Paradise Lost” que, à custa da voz, dos riffs, do arrasto e da atmosfera não deixa entrar qualquer luz. Alguns dos seus momentos mais intensos pode fazer lembrar uns Mourning Beloveth, e é uma boa referência para o catártico acompanhamento desta “Premonição” que tinha mesmo que ser lançada. São as piores circunstâncias que tornam este disco especial, mas além da música ser indubitavelmente boa, – os frutos que isto tinha para dar para encabeçar tão bem a representação do death doom sinistro e arrastado por cá! – consegue a proeza de transmitir o seu clima depressivo, ao mesmo tempo que se torna celebratório. Sigamos o exemplo no que toca a arrependimentos. E obrigado por tudo, Miguel!


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