Vodafone Paredes de Coura 2025: Contas Finais

por José V. Raposo em 1 de Setembro, 2025

Vodafone Paredes de Coura 2025: Contas Finais
© Hugo Lima instagram.com/hugolimaphotography

E pronto, parafraseando o Diácono Remédios, o festival é um bom festival, não havia necessidade de esta edição ter acabado. Assim foi mais um capítulo da história do Vodafone Paredes de Coura, o certame (ainda não tínhamos usado esta palavra na reportagem deste ano) que nos faz percorrer centenas de quilómetros em Agosto e que nos deixou apegados a uma pequena vila minhota e a tudo o que já vivemos ali ao longo de muitos anos (em 2022 perfizemos idas ao festival em três décadas diferentes, inchem). Uma terra, um festival e um recinto que continuaram a enfeitiçar artistas a darem o melhor de si e o público a corresponder.

Como é consabido, a alma de uma campanha courense não é apenas constituída pelos concertos. Também as noites de estágio na vila fazem parte do histórico de cada edição. Este ano concentrada no Xapas e seu novo formato, incluindo com DJ sets de ilustres do vinil, a movida courense pré-festival constrói e reforça amizades e dá combustível para recordações futuras, seja com um bitoque no Barbaças, picanha no Miquelina ou um mocktail no Xapas.

Tudo isto sem esquecer o décimo primeiro set de GPSS na mesma instituição de Coura. Este ano com direito a breakdance, flexões e jogo de futebol na pista, os duros (de ouvido) continuaram a soar as estopinhas ao som das 130 BPM do costume (e não só), sob o olhar atento de Mike Patton, do Sensei Manuel Almeida (OSS) e de muitas mais personagens que o glorioso colectivo traz consigo nas projecções.

Numa edição forte em cantautores, vimos, num só dia, Cass McCombs distribuir mestria na escrita de canções (em dose dupla!), Samuel Úria a dar o seu maior e melhor concerto de sempre em Coura, Nilüfer Yanya a mostrar o porquê da sua ascensão e a consagração de MJ “Mário Jorge” Lenderman, o grande bardo de Asheville. Também no arranque “a doer” constatámos que os Vampire Weekend deveriam ter lugar cativo em Coura, de preferência com todos os saxofones, violinos e enciclopédias que puderem trazer.

Se os Maruja não marcaram presença no segundo dia, LA LOM transformaram Coura numa paisagem californiana de ontem, Perfume Genius deu um recital a precisar apenas de um microfone, uma cadeira e de um conjunto de grandes canções e os Portugal. The Man até a quem não era fã conseguiram agradar, conquistando um tricampeonato courense com um festão de antologia.

Depois do batalhão de cantautores no primeiro dia, foi a vez de, no terceiro, uma armada inglesa fundear no Coura, acompanhada de um aperitivo de pop do futuro que olhou para ontem. O agora divorciado e solto da franga Geordie Greep continua a martelar memórias nos anais do festival, os Bar Italia finalmente apareceram (e completamente despojados de timidez e cheios de sangue na guelra) e os Black Country, New Road desmentiram tudo o que se tem dito de negativo sobre o seu novo álbum e foram um estrondo que não precisou de bombardeio. E como por ali também se podem servir aperitivos ao fim da noite, Mk.gee trocou as voltas às convenções e deixou muita gente boquiaberta e com fome de futuro.

Num quarto dia que rematou em beleza a edição, os DIIV renovaram as nossas loas num anfiteatro natural que pareceu feito de encomenda para a sua visão do shoegaze, Sharon Van Etten (com a companhia dos novíssimos Attachment Theory) finalmente matou o borrego de figurar na galeria de notáveis que por aqui passaram, os Warmduscher deram uma festa fora de horas (por antecipação), os Franz Ferdinand ganharam o seu tricampeonato a passar em revista os êxitos e os Gurriers deram duas voltas à chave a esta edição e atiraram a chave ao pit, com a quase certeza de que a próxima vinda será já ali em baixo no palco principal. Já os Air, bem, a medalha de ouro (e a presença nos campeões da edição) combina muito bem com os seus uniformes brancos.

Dos biquinis e camisolas antigas de futebol (parecia uma mescla de Liga dos Últimos com Liga dos Campeões) aos regressos históricos, foi mais uma edição que muito contou para além da farpela dos presentes. Neste quesito e indo ao arquivo das nossas memórias pessoais de Coura, recordamos um dos nossos que fez, há precisamente uma década, uma campanha de MVP do festival a precisar apenas de um boné de certo canal de televisão e de improvisar um slogan sobre o mesmo, repetido até à exaustão.

No que toca à sustentabilidade e qualidade de vida no festival, se haver dias e passes gerais esgotados é uma excelente notícia para quem organiza, a circulação nos dias de enchente, em particular no sábado, deixou a desejar. Menos dois ou três mil bilhetes vendidos (ou o necessário para equilibrar receita com a promessa de diferença em relação aos demais festivais grandes) e as deslocações entre palcos e até à restauração teriam sido mais proveitosas.

Mas, lá está e como já se disse antes, o que, na maioria dos festivais ditos grandes é um suplício, em Coura é bem mais tolerável. Não vale a pena evitar o festival porque o palco secundário é isto e aquilo porque não há mesmo outra maneira de dar a volta a esse texto e, diga-se, a opção (possibilitada pela meteorologia altamente favorável deste ano) de prescindir de uma tenda nesse palco acabou por se revelar acertada.

Dito isto, nesta óptima edição descobrimos os prazeres de um sarrabulho (experimentem com molho de bifana, que não é batota nenhuma) às três da matina depois de se ter encerrado o expediente do festival. Fazer a viagem para baixo (com a playlist do festival aos berros no carro, claro) e escrever estas linhas continua a ser um exercício proveitoso no qual nos passa pela memória muita recordação boa num ano pessoalmente difícil. Não se ponham a imitar o Clapton, tirem a grelha da chuva e se alugarem um Ferrari venham antes a Coura.

Paredes de Coura não é um amor de Verão. É mesmo de todo o ano e mais além.

Seguem as contas finais desta edição.

i) CAMPEÕES PAREDES DE COURA 2025: Air; MJ Lenderman & The Wind; Vampire Weekend; Black Country, New Road; Cass McCombs (x2); DIIV; Sharon Van Etten & The Attachment Theory; Samuel Úria; Perfume Genius; LA LOM; Geordie Greep; Bar Italia; Mk.gee; Gurriers;

ii) Menções honrosas: Being Dead; Joey Valence & Brae; Nilüfer Yanya; Cassandra Jenkins; Portugal. The Man; Warmduscher;

iii) Tivemos pena de ter perdido: Terno Rei (o final da última canção não conta);

iv) Gostaríamos de ter visto mais: Chastity Belt;

v) Podem ficar em 2025: pessoas que furam fora de tempo e, pior do que isso, voltam para trás; pessoas que não se calam durante os concertos; pessoas que incomodam os outros com adereços ridículos e que nem sequer pedem desculpa;

vi) Palavras e expressões do festival: “295 canais”; “antena da DIGI”; “trinta pau”; “vou querer”; “ratazanas e minas”; “A ELES!”; “Mário Jorge”;

vii) Queremos ver/rever no Couraíso*: Daily Toll; Joshua Ray Walker; Porcelain; Boucabaca; Cortada; PUP; The Armed; Algernon Cadwallader; William Tyler; Bedridden; Bob Mould; Charif Megarbane; Civic; Dutch Interior; Deftones; Fib; Pile; Action Bronson; La Dispute; Touché Amoré; Titus Andronicus; Porcelain; Yung Xalana; High.; Humour; Immen; Lesma; Lifeguard; L.S. Dunes; Kurt Vile; Mohammad Mostafa Heydarian; Neptunian Maximalism; The Spirit of the Beehive; Garrett T. Caps; Open Head; Panda Bear; Radar Men from the Moon; Rats on Rafts; Rattle; Stereolab; terraplana; Prolapse; Nick Cave and the Bad Seeds; Maruja; Hazel English; Hetta do Montijo; Unwound; Courtney Marie Andrews; Still House Plants; Tunic; Birds in Row; Tyler Childers; Wednesday; The Tubs; Water Damage; Vulture Feather; Mandy, Indiana; Songhoy Blues; Water from Your Eyes; This Is Lorelei; Tramhaus; Yard Act; Cindy Lee; Mannequin Pussy; Marissa Nadler.

Já falta menos de um ano para os dias 12 a 15 de Agosto de 2026. Até para o ano.

* – De notar que da nossa lista do ano passado vieram este ano a Coura nada mais, nada menos do que três (!) nomes (com Maruja teriam sido quatro): Black Country, New Road, Bar Italia e Geordie Greep. Agora só nos falta acertar no Euromilhões (mas para isso era preciso jogarmos naquilo).

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