Que fazem 10 pessoas numa sala com 400 lugares?
por Isabel Leirós em 23 de Outubro, 2017

No último dia da 2ª edição do Close Up em Famalicão, foi exibido Der Amerikanische Freund, ou The American Friend, ou ainda O Amigo Americano, filme neo noir de Wim Wenders datado de 1977 e uma ode ao cinema, com apontamentos de luz e cores saturadas de Robby Müller, em que Dennis Hopper lança umas vibes de Midnight Cowboy e Bruno Ganz é um homem à espera da morte, sem nada a perder.
Adaptado do romance Ripley’s Game de Patricia Highsmith, conta-nos a história de um doente terminal que se envolve em dois assassinatos, em troca de uma recompensa para deixar de herança à família. É um clássico do cinema, portanto.
Cheguei à sessão com uns minutos de atraso, o que me obrigou a entrar na sala já escurecida e a sentar no primeiro lugar disponível, pois não queria incomodar a plateia. Quando a tela iluminou a sala, troquei de lugar, percebi que havia alguns lugares vazios umas filas acima.
Mas foi quando o filme terminou e as luzes acordaram, que me deparei com um cenário preocupante: no grande auditório da Casa das Artes de Famalicão, com cerca de 400 lugares, estavam apenas uns 10 espectadores juntamente com elementos da organização do Close Up.
É difícil explicar como é que isto ainda acontece.
Wim Wenders poderia até há bem pouco tempo ser considerado um realizador difícil, mas com o devir dos tempos e a sucessão geracional, mais culta e informada, reúne em Portugal cada vez mais seguidores do seu cinema.
Famalicão não é propriamente um grande centro urbano, mas de enorme proximidade do Porto, Braga, Guimarães, Barcelos, Vila do Conde, Póvoa de Varzim, Maia, Matosinhos, Trofa… Vinte minutos encurtam as distâncias.
A sessão tinha o preço máximo de €2. E estava agendada para um Sábado às 17h30.
Graças às redes sociais, às agendas digitais, aos agregadores culturais, às webzines e à fome voraz da imprensa por conteúdo, é cada vez mais simples e rápido encontrar oferta cultural de qualidade. É certo que a organização do Close Up ainda não aprendeu a comunicar bem, nem a aproveitar os canais e plataformas existentes para alcançar um público maior, tendo estreado um certame em 2016 usando as regras de 2003, mas isso não justifica.
Infelizmente, este é uma situação recorrente fora de cidades como Lisboa e Porto. Mas depois queixamos-nos, reclamamos e rogamos pragas aos centralistas que querem tudo para eles. Pois bem, se o centralismo perdura, se calhar a culpa até é nossa.