The Ramblers

Wet Floor
2015 | Edição Autor | Blues, Rock

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Os errantes do blues feito no Portugal têm um álbum novo. E ainda bem. Depois de um momento na ribalta, quando o nome The Ramblers foi associado ao concerto mítico de B.B. King em Sabrosa, os discípulos das raízes musicais dos Estados Unidos andaram mais ou menos sob o radar dos media. Agora temos Wet Floor a justificar estas linhas – e se o título do álbum não servir de indicador para a temática erótico-inuendo-bardajona que segue, permitam que o tornemos óbvio mais à frente.

Conspícuo pela sua ausência está o saxofone que de certa forma se havia tornado parte da identidade deste, agora, trio. Certo é que ao longo do álbum esse elefante na sala vai passando despercebido até que questionamos se ele alguma vez existiu. Os The Ramblers são três e parece até estranho que nunca o tenham sido. Canção a canção redefinem a identidade que criaram. Ao invés de colmatar lacunas que poderiam existir, contornam o problema não criando os espaços que ficariam por preencher. As guitarras assumem-se como motores das canções, que se encruzilham em contra-tempo (“Pow How”) e constroem em riffs os blocos em que assentam as canções (“Witch’s Creed”, “Wet Floor”). Os solos são exatamente o que se pede. A cola que acaba por consolidar a canção (“Dead Men Tell No Tales”). Nunca excessivos, seja em quantidade ou duração; nunca masturbatórios (“Prayer”). Uma lição para os mais novos.

E porque a omnipresença das guitarras não significa saturação, há espaço para a harmónica tomar as rédeas em “Carry Me Back”, canção genericamente acountryzada que trás à memória a “Dead or Alive” do Jon Bon Jovi. O baixo é evidenciado no trio de canções que tenta jogar com a “chapa cinco” do blues, “Blues Nest”, “Old Nest” e “Prayer”, canção que se transfigura em rogo lúgubre e se destaca do conjunto. A voz, também ela sempre presente, é acometida por uma mistura que não a deixa entrosar com os instrumentos e assemelha a experiência a um desafio de karaoke.

O que melhor se pode dizer de “Wet Floor” é que é um álbum cheio de boas composições. Mesmo os temas formulaicos – ao trio mencionado juntamos “Rockin’ And A- Rollin” – acabam por resultar quando num conjunto que inclui temas tão sui generis como “Little Girl Trouble”- melhor momento do álbum, que já comparámos a Radiohead em modo baladesco-, “Come Together”, nos seus devaneios pelo reagge, e a zeppelin-esca “Lucky Your Sour Cream”.

O pior que se pode dizer é que tematicamente tem demasiados clichés e que não raras vezes confunde lascívia com o erotismo bacoco das “Cinquentas Sombras de Grey”. Ou está alguém incrivelmente excitado(a), ou está a fazer outra pessoa incrivelmente excitada. Ou há conquista, ou ditados de regras para conquistar. O álbum chama-se “Piso Molhado” e, a julgar pela canção homónima, está há 7 anos a encharcar-se. Junte-se o inuendo à bissexualidade do eu poético e só falta o tipo da pizaria tocar à porta com uma quatro estações familiar extra queijo que ninguém tem forma de pagar em dinheiro. Junte-se ao coro dos estereótipos musicais a canção reagge sobre como através da comunhão podemos mudar o mundo e fica a tenda do cliché armada.

Será que é possível não ser só a líbido a escrever canções blues? Está a pituitária assim tão ocupada?

Os The Ramblers não parecem dispostos a responder. Talvez nem precisem, porque têm alma e isso perpassa para a música. Não suscita dúvidas que ao vivo apregoaríamos a segunda vinda do messias ao ouvir Wet Floor na íntegra, mas em casa, a prestar atenção, o talento exíguo para a lírica causa transtorno.

Talvez merecesse menos, mas porque nos vendemos por álbuns que celebram a guitarra, porque não podemos ignorar a promessa em canções como “Little Girl Trouble”, ficamos assim:


sobre o autor

Jorge De Almeida

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